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«Poderão ser a primeira UCSP a transitar diretamente para USF modelo B no país.» E assim foi!

Transparência, motivação e foco são alguns dos atributos da equipa da USF Godinho de Faria, coordenada por Hermínia Teixeira, que lhe permitiram alcançar duas conquistas importantes – ter sido a primeira UCSP (unidade de cuidados de saúde personalizados) a nível nacional a evoluir diretamente para USF modelo B e ter conseguido cumprir 100% dos critérios exigidos pela grelha DiOr-USF.

A sua integração numa ULS (unidade local de saúde) e a centralização de todo o seu funcionamento na aplicação Teams maximizam o seu desempenho, graças à melhoria dos processos assistenciais e organizacionais.



"Porque não fazê-lo agora?"

A ideia da criação de uma USF já tinha sido lançada há alguns anos, mas não existia unanimidade na equipa médica, o que não permitia o seu avanço. Em maio de 2021, quando Hermínia Teixeira regressou de licença de maternidade, num contexto de pós-covid, não encontrou o mesmo espaço:

“Os procedimentos e até algumas pessoas eram diferentes. Foi uma adaptação difícil. Aquele mundo tinha mudado, mas o meu também, porque era mãe pela primeira vez.”


Nesse verão, a equipa percebeu que quatro elementos do corpo médico estavam a aproximar-se da idade da reforma e foi essa transição geracional que permitiu equacionar a definição de uma nova forma de organização.

“Precisávamos de criar um objetivo a longo prazo para a Unidade e a formação de uma USF permitia-nos escolher os profissionais com quem queríamos trabalhar”, refere. Foi essa a proposta que fez aos colegas:

“Se sempre fizemos um bom trabalho e vamos precisar de acolher pessoas novas, porque não fazê-lo agora? Estão reunidas todas as condições necessárias.”


Hermínia Teixeira

Indicadores que "pareciam viabilizar o objetivo"

Em novembro, Hermínia Teixeira assumiu a coordenação da Unidade e avançou com o agendamento de uma reunião com José Carlos Alvarenga, coordenador da Equipa Regional de Apoio e Acompanhamento (ERA) do Norte, após a anuição dos colegas e da ULS de Matosinhos, para averiguar a viabilidade da criação de uma USF.

Foi nesse encontro que acabou por ser surpreendida com a possibilidade de a UCSP transitar diretamente para USF modelo B, algo que, apesar de previsto na lei desde 2007, nunca tinha acontecido até então a nível nacional.



A médica ainda se recorda bem da resposta que recebeu: “Porquê USF modelo A, se têm uma equipa estável e ajustada e um IDG (índice de desempenho global) superior a 75%? Com a melhoria de alguns indicadores, poderão ser a primeira UCSP a transitar para USF modelo B no país.”

De facto, a médica reconhecia que “a equipa trabalhava muito bem enquanto UCSP, o que permitiu que houvesse indicadores muito válidos que pareciam viabilizar a concretização daquele objetivo”.

Hermínia Teixeira sabia tratar-se de um “desafio muito difícil de alcançar, dado todos os trâmites burocráticos associados”, e foi esse trabalho que guiou a equipa nos meses seguintes. Ao nível do espaço físico, as condições estavam praticamente todas reunidas, pois, a UCSP tinha sofrido obras nesse ano de 2021.

“Todos temos um gabinete próprio, aquilo que poucas unidades conseguem. Apenas melhorámos a sala de espera, com a criação de um espaço dedicado às crianças, em março de 2022, com o apoio de um mecenas, nosso utente”, refere.


Elementos da equipa

O "papel essencial" da ULS Matosinhos


A grande mobilidade de recursos humanos aconteceu entre dezembro de 2021 e fevereiro de 2022 e a coordenadora recorda-se que a tarefa não foi fácil: “No fundo, eu não tinha nada para lhes oferecer, porque ainda éramos uma UCSP, e não lhes podia prometer que o processo ia correr bem.”

Ainda assim, conseguiu captar secretários clínicos e enfermeiros que estavam noutras unidades de Matosinhos, “graças também ao apoio institucional que existiu por parte da ULS Matosinhos, que teve um papel essencial como facilitador desta tarefa”.

Dada a falta de autonomia de gestão das UCSP, “o facto de a ULSM ter acreditado no projeto e transmitido sempre compreensão e motivação permitiu que as mobilizações acontecessem com celeridade”.


Hermínia Teixeira: “Profissionais motivados numa Unidade mais organizada conseguem dar uma melhor resposta aos utentes”

Os médicos iam sendo convidados à medida que os anteriores se reformavam e praticamente todos tinham sido internos da ULSM. “Formámos uma equipa muito jovem e motivada, constituída por recém-especialistas, o que, para mim, foi estranho, porque, enquanto há dois anos era a mais nova, rapidamente passei a ser a mais velha”, evidencia.


A transparência enquanto um dos principais fundamentos

A 1 de fevereiro deste ano, a USF Godinho de Faria foi inaugurada como modelo B, após meses de trabalho que culminaram com a aprovação do projeto, a 20 de dezembro de 2022, aquando da auditoria final.

O processo aconteceu no espaço de um ano, de acordo com o preconizado, no entanto, Hermínia Teixeira tem consciência de que a maioria das unidades acaba por ultrapassar esse período. “Nós simplesmente cumprimos todos os timings e assegurámo-nos de que os restantes envolvidos também os respeitavam”, explica.

No dia em que o projeto foi aprovado, a equipa foi parabenizada também por ter sido a primeira Unidade da ARS Norte e, provavelmente, de todo o país, a cumprir a totalidade dos critérios de avaliação (133) da Grelha DiOr.



A sala de espera traduz, desde logo, a organização e transparência da Unidade, ao ter afixado nas paredes quadros vários, relativos a temas como o nível de satisfação de utentes e profissionais, o tempo médio de espera para consulta, elogios e reclamações, e as férias da equipa. Também em várias
mesas de apoio estão diversos panfletos elaborados quer pela USF, quer pela ULSM, sobre áreas como a saúde oral e a atividade física. “Tudo isso corresponde a parâmetros que são avaliados e conseguimos cumprir todas as exigências”, evidencia.

Essa foi uma das metas que traçaram, “para que não houvesse dúvidas do mérito da equipa”. E, no fundo, “o ‘não’ era garantido, pois, se o modelo B não fosse reconhecido, o modelo A seria-o certamente”. Tal levou o grupo a pensar: “Se estamos num projeto inovador e não queremos arriscar, vamos esforçar-nos por cumprir todos os critérios e não falhar, mesmo sabendo que a transição para modelo B é conseguida cumprindo 100% dos critérios A e apenas 60% dos critérios B.”




"Acho que fizemos um trabalho inigualável"

Dois meses após a inauguração, avalia: “O resultado foi o adequado e mais do que merecido. Acho que fizemos um trabalho inigualável e provavelmente irrepetível, porque é um processo bastante exigente, que só se consegue concretizar com uma equipa muito motivada e focada.”

Ao longo desse trajeto, Hermínia Teixeira refere ter tido “muitas noites sem dormir e fins de semana sem descansar, pelo facto de o processo ter sido condensado num ano e ter tido um grau de exigência muito elevado”.

De facto, trata-se de “um processo burocrático surreal, relacionado com gestão e qualidade”, e, apesar de reconhecer a sobrecarga associada, distingue a “mais-valia que trouxe ao nível da organização e do funcionamento da Unidade, transpondo-se numa maior capacidade de desempenho”. Para si, a explicação é simples: “Profissionais motivados numa Unidade mais organizada conseguem dar uma melhor resposta aos utentes.”

Apesar de a coordenadora reconhecer que a Unidade já funcionava muito bem enquanto UCSP, realça o facto de a evolução para USF ter trazido “uma maior monitorização dos indicadores e, por conseguinte, justificando a restruturação das agendas, a fim de garantir a capacidade da equipa para responder à necessidade de consultas programadas em cinco dias, e de consulta aberta no próprio dia, o que é muito bom”.

Hermínia Teixeira avança que “seria muito bom se as USF modelo B se conseguissem generalizar, pois, é o tipo de funcionamento que melhor consegue fixar os profissionais no SNS”.

No entanto, alerta que, para tal, “é necessário aliviar a operação, pois, não é viável continuar a exigir às equipas um processo tão burocrático como este”. Ainda assim, a Unidade tem colaborado com outras equipas da ULSM, para que também tentem chegar ao mesmo objetivo. “Estamos sempre prontos para ajudar”, comenta.



Integração na ULS Matosinhos “traz muitas vantagens"

A integração da USF numa ULS é uma dinâmica muito apreciada pela coordenadora, pois, “traz muitas vantagens, como a dinamização de projetos comuns, a articulação de cuidados com as mais diversas especialidades, a maior proximidade com o corpo hospitalar e a maior confluência de exames, resultando numa mais-valia para os utentes”.


Hermínia Teixeira especifica: “Perante o surgimento de alguma dúvida relativamente a um utente, podemos contactar o colega da especialidade mais adequada, discutir o caso e trocar opiniões, por exemplo.”

No caso da Pediatria, existe inclusivamente um apoio referenciado pediátrico, que permite que uma criança atendida na USF que necessite de ser avaliada a nível hospitalar seja enviada diretamente a uma equipa, sem necessidade de passar pela Urgência.

A mesma dinâmica acontece com a generalidade dos doentes: “Se considerarmos que um idoso com insuficiência cardíaca descompensada precisa de ser avaliado no Serviço de Urgência, antes, é estabelecido um contacto com o colega de Medicina Interna que lá estiver nesse momento para sinalizar a situação.”

A médica considera que, desta forma, “está a permitir-se a articulação de cuidados em áreas específicas e a desincentivar-se as idas proativas dos doentes à Urgência, pois, sabem que na USF são atendidos e, em caso de necessidade, serão encaminhados ao Hospital Pedro Hispano, de forma ágil”.



Existe ainda uma forte articulação ao nível da Consulta Aberta, de tal modo que, “principalmente no pico de maior afluência no inverno, quando é muito difícil responder a todas as solicitações, a ULS cria uma Consulta Aberta pós-laboral, entre as 17h e as 21h, realizada no Centro de Saúde de Matosinhos por médicos de família, para reforçar a resposta e evitar que os utentes se desloquem à Urgência”.

Também a internalização das análises é uma componente que destaca, pois, permite que “sejam colhidas no edifício e registadas automaticamente no processo clínico do utente no hospital e na sua unidade de saúde”.

Até fevereiro de 2023, ainda enquanto UCSP, era disponibilizada a Consulta de Cessação Tabágica por uma médica de família, que se tinha diferenciado na área, com o apoio da equipa de enfermagem, por iniciativa da ULSM. Com a centralização dessa Consulta no Centro de Saúde de Matosinhos, tal necessidade deixou de existir.



A reportagem completa pode ser lida na edição de maio do Jornal Médico dos Cuidados de Saúde Primários. Inclui entrevistas a diversos profissionais da equipa.

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