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Opinião

«Quem matou o SNS?»


Joana Barrona

Médica interna de FE em MGF



Diariamente assistimos a um agravamento da precariedade do nosso Serviço Nacional de Saúde (SNS), o que inexoravelmente nos afeta a todos, quer como profissionais, quer como utentes.

Todos sabemos que as condições para os profissionais de saúde se manterem no SNS são cada vez instáveis, com falta de investimento quer a nível das infraestruturas e recursos materiais, quer a nível das condições de trabalho e remuneração salarial, cada vez mais indigna para profissionais que continuam a ser fundamentais para a prosperidade de uma sociedade.

Sabemos também que as condições de saúde da população se têm vindo a deteriorar, com diagnósticos cada vez mais tardios e uma resposta para tratamentos urgentes, como é o caso das patologias oncológicas, cada vez mais atrasada.

Tudo isto tem trazido consequências deletérias à saúde da população portuguesa e tem afastado os profissionais de saúde do serviço público, dada a discrepância de condições e oportunidades que o setor privado oferece e que o SNS nem tenta igualar.

Quer decisores políticos, quer utilizadores do SNS, têm vindo a ignorar o facto de que todos nós temos responsabilidades quando falamos da sobrevivência e do bom funcionamento de um serviço de saúde, tendencialmente universal e gratuito.

Deixa-me especialmente indignada o facto de se “utilizar” o médico de família (MF) e os cuidados de saúde primários (CSP) como os bombeiros do SNS. Quando tudo o resto está a falhar, chamemos os MF para remediar o problema.




As urgências estão lotadas? Enviemos os doentes para os centros de saúde. Precisamos de médicos para atender aos doentes suspeitos ou infetados com covid-19? Tiremos os MF do seu posto de trabalho. Precisamos de médicos para vigilância da vacinação contra a covid-19? Tiremos novamente os MF do seu posto de trabalho. E o nosso trabalho, quem o fará? A atividade preventiva e a gestão de doenças crónicas devem cair para segundo plano?

Numa região com perto de um milhão de utentes sem médico de família, como a de Lisboa e Vale do Tejo, parece-me irrealista, e até anedótico, acreditar-se que os CSP vão suprir as necessidades relativas à doença aguda. Será à custa de suspenderem a sua atividade programada para a vigilância de grávidas, crianças e doentes com patologias crónicas?

Parece-me a mim que o objetivo é fazer esta especialidade retroceder e perder toda a progressão que teve até agora, com todos os benefícios que demonstrou ter em ganhos de saúde. Estamos a evoluir para uma medicina terceiro-mundista, em que se centram esforços no tratamento de doença aguda, ao invés de se investir na prevenção.

Nos hospitais o importante é fechar as escalas de urgência e nos centros de saúde o essencial é ter vagas para consultas do dia para doença aguda e para renovar baixas.

Que tomemos como exemplo o que se faz a norte do país, em que os resultados em saúde são amplamente superiores, com maior satisfação por parte dos doentes e dos profissionais de saúde.

Que façamos todos nós, enquanto cidadãos, uma reflexão e não deixemos morrer o nosso SNS, porque, se isso vier a acontecer, todos seremos culpados.


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