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«Pretendemos desenvolver programas que reduzam o impacto das doenças CV na comunidade»




O primeiro presidente português da Sociedade Europeia de Cardiologia tomou posse do cargo no início de setembro, durante a realização do congresso anual. Em entrevista ao Jornal Médico, Fausto Pinto fala daqueles que são os seus objetivos para este mandato, que, segundo indica, passam muito por garantir a continuidade e a qualidade do trabalho e desenvolver programas que visem reduzir o impacto das doenças cardiovasculares na comunidade.

Fausto Pinto é, desde 2 de setembro, o novo presidente da Sociedade Europeia de Cardiologia (SEC). O professor de Cardiologia da FMUL e diretor do Serviço de Cardiologia do Centro Hospitalar de Lisboa Norte torna-se, assim, o primeiro português e, também, o primeiro ibérico a assumir o mais alto cargo desta sociedade.

Após ter sido eleito em 2012, por ocasião do Congresso de Munique, Fausto Pinto tomou posse durante a Assembleia-Geral do Congresso deste ano, em Barcelona, num momento caracterizado por si como muito “importante e emotivo”.

“Considero tratar-se de um marco na minha vida pessoal e na minha carreira e espero fazer o melhor possível, não só para honrar o lugar, mas para fazer o melhor pela Medicina Cardiovascular (CV) e, ainda, poder projetar a Cardiologia e a voz portuguesas”, afirma.

E desenvolve: “Enquanto presidente da SEC, o meu grande objetivo é manter a sociedade unida, forte e comprometida com o desenvolvimento de programas que têm como finalidade reduzir o impacto das doenças CV na comunidade e melhorar a saúde CV das populações, com impacto no bem-estar da comunidade. Assumimos isso como um compromisso e um dever”.

Fausto Pinto lembra que a SEC é uma sociedade grande, com uma longa história, que data de 1950 e que, como tal, pretende garantir a continuidade do “excelente trabalho” desenvolvido.

SEC focada em diversas áreas de atuação

Um dos aspetos que Fausto Pinto considera importante é poder garantir a união de toda a comunidade CV. “Na Europa, temos o privilégio de sermos uma só sociedade que envolve todas as áreas da Cardiologia. Embora sejamos um continente de vários países, conseguimos criar uma estrutura federativa, com 56 sociedades nacionais sob a mesma estrutura”, menciona.

A educação é uma área que o nosso entrevistado frisa como um dos aspetos mais centrais de qualquer sociedade científica, referindo que, a par dos eventos que têm vindo a ser organizados, está a desenvolver um forte programa de educação da comunidade CV, com vista à sua melhoria.

A sociedade vai focar-se, também, no advocacy e no lobbing e, para tal, abriu, há cerca de ano e meio, uma delegação em Bruxelas – de forma a estar perto dos decisores políticos –, com o objetivo de reduzir o peso da doença CV e promover estilos de vida saudáveis e a saúde CV.

Nesta estrutura foram formados departamentos específicos. Fausto Pinto menciona a criação de cursos de formação pós-graduada, estimulando a cooperação com as universidades. Foi, também, desenvolvido um Observatório de Saúde Cardiovascular, onde é feita a monitorização do que se passa nos vários países da SEC, no âmbito dos indicadores de saúde CV.

Igualdade de acesso à inovação e desenvolvimento

Estes são aspetos que o nosso entrevistado pretende “promover de forma muito objetiva”. Nesse sentido, indica estar a trabalhar para harmonizar o ensino e a formação da Cardiologia a nível europeu, “que é ainda muito desigual”, assim como para promover o acesso das populações à inovação e ao desenvolvimento.

“Procuramos criar condições e trabalhar com as sociedades nacionais a fim de melhorar o acesso das populações à inovação, uma área muito desigual em termos europeus e, muitas vezes, até mesmo dentro dos países”, nota, explicando que tem também como finalidade promover a informação junto dos governos, de forma a influenciar decisões que tenham impacto em termos de Saúde Pública.

A Lei Anti-tabaco e a redução de sal na alimentação são dois bons exemplos, já com reflexos importantes e com melhoria significativa em alguns indicadores de saúde.

Por fim, porém, não menos importantes são o Programa de Registos Europeus, que permite fazer uma monitorização da realidade da Medicina CV a nível europeu, nos vários países e, ainda, a continuação da produção de guidelines que traduzem a evidência e o consenso dos maiores peritos nas várias áreas.

Congresso da SEC acolheu 31 mil participantes

A cidade de Barcelona, Espanha, acolheu, este ano, de 30 de agosto a 3 de setembro, o Congresso da Sociedade Europeia de Cardiologia (SEC), que, de acordo com Fausto Pinto, o novo presidente desta sociedade, “excedeu as expectativas”.

“Tivemos cerca de 31 mil participantes vindos de todo o mundo, o que é fantástico, tendo em conta a crise económica que se vive em termos internacionais”, observa. E acrescenta: “Para nós, é um motivo de orgulho podermos dizer que temos, neste momento, o congresso mais visível e forte a nível mundial”.

Em 2015, o Congresso da SEC terá lugar em Londres, Inglaterra, entre os dias 29 de agosto e 2 de setembro.

Cardiologia portuguesa ao nível da praticada na Europa

Questionado acerca do estado da arte da Cardiologia Portuguesa, o presidente da SEC responde que a especialidade em Portugal, apesar dos constrangimentos que temos tido, pode “ombrear” com a Cardiologia praticada a nível europeu.

Contudo, existem algumas ameaças que deveremos ter em consideração, como o acesso à inovação, os recursos humanos, que devem ser adequados aos cuidados que pretendemos prestar, e, ainda, a importância de apoiar a medicina académica, para que cumpra, não só, o seu papel de prestação de cuidados, mas também de investigação.

“MGF tem papel fundamental na prevenção das DCV”

A MGF tem um papel fundamental no que respeita à prevenção e seguimento das doenças cardiovasculares, que continuam a ser ainda a principal causa de mortalidade e morbilidade em todo o mundo.

“Considero que a sua intervenção talvez seja até mais importante que a do cardiologista, quando falamos em termos comunitários”, afirma Fausto Pinto, presidente da Sociedade Europeia de Cardiologia, observando que o acesso do médico de família à população, por exemplo, para a promoção de estilos de vida saudáveis e para a redução dos fatores de risco é muito importante.

“Quando falamos em prevenção primária, mas também secundária, a MGF tem um papel essencial e isso está documentado”, salienta.

Fausto Pinto indica, ainda, que a articulação com os hospitais não é menos importante, referindo existirem já mecanismos para tal. “Só é possível fazer uma boa Medicina se tivermos bons CSP, uma boa MGF e uma boa articulação desta com os cuidados terciários a nível hospitalar. Há ainda muito a fazer, já avançámos, porém, temos de trabalhar no sentido de a melhorarmos e, acima de tudo, de a tornarmos mais funcional.”

Perfil Fausto Pinto
O novo presidente da Sociedade Europeia de Cardiologia, Fausto Pinto, é também, desde o passado mês de julho, diretor do Serviço de Cardiologia do CHLN, cargos que acumula com o de professor catedrático de Cardiologia na FMUL, de presidente da Associação para a Investigação e Desenvolvimento da FMUL, de diretor do Instituto Cardiovascular de Lisboa e de editor da Revista Portuguesa de Cardiologia.
Casado e pai de cinco filhos, o cardiologista nasceu em 1960 e teve o que considera uma infância feliz. Soube desde sempre que queria ser médico e acredita, hoje em dia, ter herdado muitas das suas características do seu pai, que, embora muito dedicado à família, era um homem com o conceito do rigor, da disciplina e do trabalho.”



Entrevista publicada na edição de outubro do Jornal Médico.

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