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Opinião

Cooperação formativa Pediatria/MGF


João Falcão Estrada

Pediatra e diretor do Internato Médico do Centro Hospitalar Lisboa Central



O conhecimento e a formação médica assentam no pressuposto de uma partilha de saberes transversal aos profissionais de saúde, independentemente da sua área base de formação e de atividade clínica e, por que não, de postura humana.

O conceito e primado da partilha de saberes, como obrigação do ato de ser médico, tem um fundamento tão antigo que consta e se mantém no Juramento de Hipócrates, partilhado e assumido por todos os médicos.

No caso concreto da formação em Pediatria e em Medicina Geral e Familiar (MGF), este conceito tem uma expressão objetiva nos programas formativos destas especialidades, em que se evidencia a necessidade de uma formação no Internato Médico que integra, obrigatoriamente, períodos de formação partilhados por ambas as especialidades.

De facto, em ambos os programas formativos constam períodos de formação obrigatória na outra especialidade.

No caso da Pediatria, uma formação de seis meses em cuidados de saúde primários é obrigatória desde há já cerca de 20 anos e, no caso da MGF, a formação em Pediatria, ainda que se tenha reduzido na sua duração, tem-se mantido igualmente como obrigatória ao longo dos vários programas formativos.



Se esta necessidade formativa é partilhada e assumida como necessária à troca de saberes, a mais-valia relacional entre os cuidados de saúde primários e os centros hospitalares com que se relacionam representa igualmente uma convergência e proximidade pessoal e institucional entre os médicos dos diferentes serviços, que necessariamente deverá facilitar e potenciar as relações entre os técnicos e as instituições.

O atual programa de formação em Pediatria continua a manter uma formação obrigatória de seis meses em cuidados de saúde primários (incluindo Saúde Pública), a ter lugar no período de formação em Pediatria Geral (primeiros três anos). Pretende-se que os internos de Pediatria adquiram conceitos de vigilância e seguimento da criança (e família) sem doença e possam, por outro lado, rastrear e orientar crianças em situação de doença, potenciando a normalização de critérios de referenciação e a própria referenciação aos hospitais de especialidade.

Sendo a prática médica hospitalar pediátrica essencialmente vocacionada para a doença, adquirir conceitos de prevenção e de seguimento da criança normal nas suas vertentes biopsicossociais e da nutrição, crescimento e desenvolvimento relacional e psicomotor são elementos essenciais à sua formação.

A prática de (idealmente) efetuar este estágio em centros de saúde da área do hospital de referência representa uma facilitação da proximidade e acessibilidade entre instituições de eficácia comprovada.

A formação de internos da especialidade de Medicina Geral e Familiar em hospitais pediátricos (ou serviços de Pediatria) tem como objetivo melhorar o conhecimento e a qualidade formativa, essencialmente em situações patológicas (agudas ou crónicas), permitindo um diagnóstico e referenciação precoces e, por outro lado, facilitando o seguimento em ambulatório de situações de maior cronicidade e complexidade.

No Hospital de Dona Estefânia, a presença de internos de MGF em formação é assumida com naturalidade, ainda que se deva exigir uma organização cuidada dessa programação formativa, à imagem do pretendido para todos os outros estágios formativos de especialidades hospitalares.

Na atual conceção da formação e dos objetivos de conhecimento e de desempenho pretendidos na formação pediátrica em MGF, tem sido entendido que a formação em enfermaria (doente internado) não é prioritária e, pelo contrário, deverá ser privilegiada a formação em contexto de consulta e de urgência.

Parece ser entendimento unânime que a formação em urgência é a mais eficaz em termos de aprendizagem em doença aguda, sobretudo ser for possível integrar o interno numa mesma equipa de urgência e/ou em estágios mais prolongados (um mês seria o ideal) e/ou sempre com a presença do mesmo responsável de estágio.

Quanto à rotação pelas consultas, que deverá merecer uma programação cuidada, que permita ao formador ter como clara (e já intuída e organizada) a presença de um interno de MGF em formação, é permitido ao interno ter áreas de opção, ainda que algumas se considerem essenciais.



Estão neste caso a Cirurgia Pediátrica, a Ortopedia Pediátrica, o Desenvolvimento, a Endocrinologia, a Neonatalogia (recém-nascido normal), a Neurologia, a Otorrinolaringologia, a Reumatologia e a Infeciologia, entre outras. A formação nestas áreas poderá ser efetuada em períodos semanais, ou preferencialmente, se possível, com uma organização adequada, em simultâneo com a consulta de Pediatria geral.

Tendo em conta a multiplicidade de consultas e o muito escasso tempo formativo disponível no programa formativo (dois meses), uma organização interna prévia à entrada do interno e a nomeação de um responsável de estágio assumem-se como imperiosas. Tendo em conta que dos 473 estágios formativos/ano (2014) efetuados no Centro Hospitalar de Lisboa Central por internos do exterior (41 de MGF) cerca de 230 são realizados no Hospital de Dona Estefânia e, destes, 62 na área pediátrica, um conhecimento atempado da vinda de cada interno integra-se necessariamente nesta indispensável organização.

De realçar ainda que as formações organizadas, tanto nos centros de saúde (coordenação de MGF), como sobretudo nos hospitais (ainda que eventualmente realizadas em sede dos centros de saúde) deverão ter um componente orientado para a formação destes internos e ser divulgadas bilateralmente, de forma a permitir prolongar no tempo a formação e o relacionamento de proximidade entre os internos médicos destas especialidades. 



Artigo publicado no Jornal Médico dos cuidados de saúde primários de setembro.

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