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Doenças raras: «Um dos maiores problemas está na falta de um registo nacional»

Entrou no mundo das doenças raras quando, há 13 anos, diagnosticou mais do que um caso de doença de Fabry numa família. Em entrevista à Just News, Luís Brito Avô, coordenador do Núcleo de Estudos de Doenças Raras (NEDR) da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI), explica porque vê com satisfação a nova legislação, que veio substituir o Plano Nacional das Doenças Raras, relembra a importância do cuidador, cuja situação é, “por vezes, dramática”, e salienta a falta de registos nacionais de doenças raras.

Na sua opinião, o conhecimento sobre as doenças raras "tem tido uma evolução muito favorável e, hoje em dia, a capacidade de as diagnosticar é mais efetiva. Sendo cerca de 80% delas de origem genética, a evolução notável da Biologia Molecular permitiu um excelente avanço na sua identificação através de testes."

Contudo, refere que "continua a existir uma enorme dificuldade em termos do diagnóstico clínico, o que é compreensível, ou não estivéssemos a falar de patologias raras, algumas extremamente raras".



Questionado sobre quais os principais desafios, Luís Brito Avô afirma que "estamos numa fase de transição" e explica:

"O Plano Nacional para as Doenças Raras, aprovado em 2008, foi revogado há poucos meses. Esta mudança trava, de alguma forma, o processo que estava em curso, mas também é uma mais-valia juntar o Ministério da Saúde ao da Educação e Ciência e ao da Segurança Social e Solidariedade, numa estratégia comum, para dar resposta aos múltiplos aspetos que implicam estas patologias."

Outro ponto que considera positivo "é que já está em fase de concurso a constituição dos centros de referência e a criação, formal, de uma Rede Nacional para múltiplas DR. O SNS passa, assim, a oferecer uma resposta mais adequada aos doentes e seus familiares."

Acrescenta ainda que "é de salientar que a existência de centros de referência obriga a planeamento, responsabilização, centralização de custos e de distribuição de fármacos – os medicamentos órfãos são, na sua maioria, de dispensa hospitalar. A sua classificação contribui para uma melhor publicitação das instituições exemplo de boas práticas – muitas, aliás, já existem, simplesmente, não estão reconhecidas oficialmente."

A necessidade de um registo nacional de doenças raras

Em termos de investigação, o especialista indica que tem sido uma área onde escasseia o investimento, "mas não estamos parados". Esclarece que, "apesar das limitações de tempo e de recursos financeiros, os portugueses têm estado envolvidos em vários estudos nacionais e internacionais. A iniciativa Horizon 2020 abriu uma enorme janela de financiamento, oportunidade que os centros nacionais não devem perder. Penso que um dos maiores problemas está na falta de um registo nacional de doenças raras."

O coordenador do Núcleo de Estudos de Doenças Raras salienta que, "nalgumas patologias sabe-se qual a incidência, noutras não. Calcula-se que Portugal tenha entre 600 a 800 mil pessoas com DR, mas é do conhecimento geral que há muitas que não estão registadas. Conhecer corretamente a epidemiologia é um dos primeiros passos para lançar projetos de investigação clínica nacionais. Nalgumas áreas da patologia já há vários projetos em curso e, do ponto de vista de investigação básica de ciências biomédicas, os nossos centros universitários também estão ativos."



Cuidadores de doentes raros "revelam capacidades extraordinárias"

Entre vários outros temas desenvolvidos ao longo da entrevista, Luís Brito Avô afirma que a situação do cuidador é "dramática!". Refere que "os cuidadores revelam capacidades extraordinárias e não é incomum ver mães – sobretudo mães – que deixam o emprego para cuidar, a tempo inteiro, dos seus filhos. Isto tem consequências para a sua saúde física e psíquica, mas também a nível financeiro."

Sublinha que "é verdade que a maioria das instituições já tem um horário escolar que permita à família trabalhar", mas que tal "não é suficiente. É preciso existirem locais onde se possa confiar os filhos, para se descansar, tratar da saúde, tirar férias, estar com os outros filhos e com o marido. Deviam existir também ajudas financeiras para se conseguir o apoio de um cuidador profissional e as tabelas de incapacidade, que já têm algo definido para situações típicas de doenças raras, devem ser atualizadas."



A entrevista completa com Luís Brito Avô pode ser lida no Jornal do VI Simpósio do Núcleo de Estudos de Doenças Raras. Editada pela Just News, a publicação estará acessível a todos os participantes da reunião.

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