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A intervenção nutricional em idosos hospitalizados «ajuda a reduzir os dias de internamento»

Os resultados que vão sendo visíveis nos doentes idosos internados no Hospital Ortopédico de Sant’Ana são animadores, mas não surpreendem João Gouveia Martins, coordenador do Serviço de Nutrição desta unidade, que tem investido na formação nutricional de profissionais de saúde e colaboradores de alimentação.

Em declarações à Just News, o responsável explica que “o nutricionista pode prescrever a melhor solução terapêutica, mas, se não existir um bom executor a partir da cozinha, o produto final e a própria prestação do melhor cuidado ao doente fica em risco”. 

Este foco na formação da equipa da Unidade de Alimentação do hospital é uma das medidas que João Gouveia Martins tem implementado desde que assumiu a coordenação da Nutrição no Hospital Ortopédico de Sant’Ana, em 2015, e que passa muito, precisamente, pelo conceito de inclusão e de conjugação de esforços de variados profissionais, a bem do doente.


Elementos da equipa da Unidade de Alimentação

A alimentação na recuperação do doente idoso internado

Criar momentos de partilha de conhecimento foi um dos objetivos de João Gouveia Martins, quando alavancou o Serviço de Nutrição, há cinco anos. Este trabalho formativo, que procura desenvolver uma vez por mês, visa ir ao encontro das recomendações da própria Sociedade Europeia de Nutrição Clínica e Metabolismo (ESPEN), que defende que “além da intervenção de excelência do ponto de vista clínico, deve existir um investimento na formação dos colaboradores dos Serviços de Alimentação”.

Uma perspetiva que, para João Gouveia Martins, vem corroborar a evidência científica que “a má qualidade da prestação destes Serviços está relacionada com o desenvolvimento de quadros de desnutrição a nível do internamento hospitalar”.

Apesar de neste preciso momento as ações de formação se encontrarem temporariamente suspensas devido à pandemia, tem sido feito um esforço para se realizarem ao longo destes meses, sempre que há margem de segurança e disponibilidade para tal. E a razão é facilmente explicada:

"Porque a alimentação adequada e segura continua a ser imprescindível...Porque os padrões de qualidade devem ser continuamente incentivados...E porque o nosso compromisso com a sustentabilidade alimentar e ambiental não mudou.."

Conforme expica João Gouveia Martins, a Unidade de Alimentação, composta por um gestor local, uma nutricionista e diversos auxiliares, é constituída por “uma equipa coesa e unida, onde a comunicação funciona”.



João Gouveia Martins

“Há 5 pilares que garantem uma alimentação adequada e o aporte nutricional do doente”

A Unidade de Alimentação (UA) é apenas um dos cinco pilares que João Gouveia Martins considera cruciais para “garantir uma alimentação adequada e o aporte nutricional do doente”. No entanto, denota que “estando a UA estabilizada, os restantes pilares podem florescer”.

Neste alicerce, elucida, são também parte integrante o próprio Serviço de Nutrição, que “faz o planeamento alimentar e incorpora todas as valências e especialidades médicas”, a Ortopedia, “responsável pelo doente”, a Medicina Interna, enquanto “elo de ligação entre a Nutrição e a Ortopedia do ponto de vista clínico e, mais concretamente, responsável pela avaliação bioquímica, essencial para a intervenção da Nutrição”. O quinto pilar é o Serviço de Enfermagem, onde se incluem “os enfermeiros, nos cuidados, e os auxiliares, no apoio na ingestão alimentar”.

Investimento na identificação do risco nutricional

A identificação do risco nutricional na admissão do doente é uma prática que o Serviço de Nutrição realiza sem exceção, desde meados de 2019, aquando da implementação do processo clínico eletrónico.

De acordo com a evidência científica “há uma prevalência significativa de risco de desnutrição no contexto ortopédico, situada entre os 22 e os 56%”, refere João Gouveia Martins, justificando assim a importância de ser feita esta identificação em todas as admissões hospitalares.

O passo seguinte é a avaliação do estado nutricional e das necessidades nutricionais do doente, de forma a construir um planeamento individualizado, explica o nutricionista. E concretiza: “fazemos a verificação de doenças que possam conduzir à má nutrição, causas de declínio nutricional, procurando uma crescente especificação consoante o doente em causa”.

Se há doentes que necessitam de “uma intervenção mais cautelosa, aprofundada, com uma maior monitorização”, outros há que “dão entrada sem qualquer patologia, não necessitando de cuidados de maior”.


João Gouveia Martins com as estagiárias Daniela Infante e Inês Ferreira

"Alavancar a recuperação do doente ortopédico"

Regendo-se por estudos científicos que apontam para o impacto da intervenção nutricional na recuperação do doente e na redução do número de dias de internamento, João Gouveia Martins acredita que o Serviço de Nutrição está “num bom caminho no sentido de alavancar a recuperação do doente ortopédico”.

O pós-alta é um dos desafios do nutricionista, que aposta no “aconselhamento alimentar junto dos familiares, de acordo com o entender clínico, de forma a garantir a adequação da dieta”, enfatiza.




A par da implementação do sistema de identificação do risco nutricional, João Gouveia Martins destaca ainda o projeto que têm vindo a desenvolver desde setembro, que consiste na avaliação do desperdício alimentar em contexto de internamento, com vista a reduzir tal índice e, diretamente, os custos que tal acarreta.

Simultaneamente, explica, estão a ser aplicados inquéritos de satisfação alimentar no internamento, o que irá permitir “identificar a causa-efeito e melhorar a oferta alimentar, de forma a reduzir os casos de diminuição da ingestão alimentar por insatisfação e, assim, prevenir quadros de desnutrição”.


 

A organização de iniciativas como meio de difusão de informação

João Gouveia Martins acredita que “por melhor que seja o trabalho desenvolvido junto dos doentes e dos colegas, a nível de intervenção clínica, é importante partilhá-lo, no sentido da troca de experiências e da promoção de soluções”.


Foi neste sentido que, a partir do momento em que fundou o Serviço, concebeu o 1.º Simpósio de Nutrição e Saúde e, no ano seguinte, desenvolveu a segunda edição.

Este ano, apesar da pandemia, mas principalmente devido à pandemia, que acentuou a temática do envelhecimento no que respeita às doenças crónicas e à desnutrição, o nutricionista voltou a pedir o contributo de múltiplos profissionais com experiência na área para integrarem uma conferência online, que se realizou nos dias 3 e 4 de novembro.

Feito o balanço, com mais de 350 inscritos e 1000 visualizações num só dia, o nutricionista destaca as “partilhas muito interessantes e o investimento da instituição e da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa na investigação, permitindo levar informação útil a todas as estruturas que a compõem”.

 
Priscila Santos da Silva, nutricionista da Unidade de Alimentação, e João Gouveia Martins, na sala de empratamento

“Temos um Serviço bem estruturado"

Com o desejo de trabalhar na área da Saúde, mas não em Medicina, João Gouveia Martins viu na promoção de hábitos alimentares saudáveis o alavanque para o seu rumo profissional. Decisão tomada, aos 18 anos ingressou no curso de Ciências da Nutrição no Instituto Universitário Egas Moniz, onde fundou e presidiu dois mandatos do Núcleo de Estudantes de Ciências da Nutrição da faculdade.

Após estagiar no Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do CHULN sob orientação de José Camolas, desenvolveu desta feita o interesse pela área da obesidade, “uma problemática que, a par da desnutrição, é relevante no contexto ortopédico, inclusivamente na recuperação pós-cirúrgica”.


João Gouveia Martins

Integrando ainda diversas academias desportivas, em 2015 iniciou a sua ligação com o Hospital Ortopédico de Sant’Ana, oficializando a constituição do Serviço de Nutrição, que tem vindo a consolidar-se ao longo do tempo, com a incorporação de colegas estagiárias, e a crescente transversalidade em relação à instituição.

“Temos um Serviço bem estruturado desde a intervenção nutricional no internamento até à gestão da alimentação, no apoio à Unidade de Alimentação, além das consultas”, refere.
 
 “Se apenas tratarmos o doente do ponto de vista articular, estaremos a falhar”

Médico ortopedista no Hospital Ortopédico de Sant’Ana há 35 anos, António Martins reconhece as mais-valias que a criação do Serviço de Nutrição trouxe ao hospital há cinco anos. Se à partida a relação entre a Ortopedia e a Nutrição poderá, para muitos, não fazer sentido, o diretor clínico, por sua vez, identifica que as duas áreas estão intimamente relacionadas, situação ainda mais evidente no caso de um hospital ortopédico.

E justifica: “temos um grupo etário de doentes muito específico, acima dos 65 anos, com patologias de base que, se não estiverem equilibrados do ponto de vista nutricional, colocam em causa todo o tratamento em termos ortopédicos, desde a consolidação da fratura até à cicatrização da ferida operatória”.



António Martins

A chegada de João Gouveia Martins para implementar o Serviço de Nutrição significou, para o diretor clínico, a certeza de que os doentes da instituição são acompanhados do ponto de vista nutricional.

“Se encararmos o doente ortopédico como uma anca ou um joelho e apenas o tratarmos do ponto de vista articular, estamos a falhar; o doente é um todo e precisa do seu equilíbrio para o sucesso do tratamento”, salienta, referindo que “o doente chega ao hospital e sabe que vai ter uma alimentação e suplementação adequada às suas necessidades”.

A conferência organizada pelo Serviço de Nutrição foi, do seu ponto de vista, “o epílogo da atividade desenvolvida pela instituição”, combinando “a troca de experiências e a abertura de horizontes com o objetivo de, a cada dia, fazer-se melhor”. Reconhecendo o trabalho e a dedicação desta equipa, António Martins salienta que poderão contar com todo o seu apoio.



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