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Opinião

«Qual o melhor modelo de organização de uma consulta de pé diabético?»


Daniel Brandão

Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular e Consulta Multid. de Pé Diabético do CHVNGaia/Espinho. Unidade de Angiologia e Cirurgia Vascular, FMUP.



A prevalência da diabetes mellitus tem vindo a aumentar de forma consistentemente progressiva a nível mundial, atingindo em Portugal sensivelmente 13,6% da população adulta, de acordo com o último Relatório Anual do Observatório Nacional da Diabetes.

Em adição às consequências ímpares que impele na saúde da população, a diabetes tem uma relevância económica considerável, não só pelos custos médicos diretos, representando em Portugal 8% das despesas em Saúde e 0,8% do Produto Interno Bruto, mas igualmente pelos custos indiretos que incidem na sociedade.

O pé diabético é uma das complicações da diabetes que mais frequentemente resulta em internamento. É particularmente impactante não só na perda de qualidade de vida e no aumento de morbilidade e mortalidade do indivíduo, mas igualmente para a família e para a sociedade, estimando-se que um doente diabético com uma lesão trófica num pé acarrete custos quatro vezes superiores a um doente diabético sem lesão.
 
Na sequência, a amputação major é o desfecho mais temido perante um caso de pé diabético e que, consequentemente, mais esforços recolhe para ser evitada. A taxa de amputação major em Portugal tem sofrido um declínio consistente ao longo dos últimos anos, contudo, com assimetrias importantes entre as várias regiões do país, provavelmente refletindo diferenças significativas nas características dos cuidados de saúde promovidos junto desse grupo particular de doentes.


Daniel Brandão


Deste modo, o benefício da presença estabelecida de consultas multidisciplinares de pé diabético na redução drástica da taxa de amputação major encontra-se claramente demonstrado na literatura médica, fazendo a sua existência parte das recomendações do International Working Group of the Diabetic Foot. Nesse âmbito, a norma n.º 5/2011 da Direção-Geral da Saúde criou três níveis de cuidados de saúde relativos ao Diagnóstico Sistemático do Pé Diabético.


Desta forma, no nível I, a atividade decorre nos cuidados primários (sendo da responsabilidade de cada ACES organizar pelo menos uma equipa na respetiva área geográfica de intervenção), enquanto que os cuidados de níveis II e III têm lugar a nível hospitalar (sendo da responsabilidade de cada unidade hospitalar a respetiva organização).


O que mais determinantemente distingue estes últimos dois níveis é a presença da valência de Angiologia e Cirurgia Vascular no nível III. Em adição, se considerarmos a evolução fortemente crescente do número de casos de pé diabético neuroisquémico em detrimento franco dos casos de pé diabético neuropático, poder-se-á facilmente entender a crucial relevância da nossa especialidade no tratamento deste grupo particular de doentes.

Não obstante, a concretização na prática clínica de uma consulta verdadeiramente multidisciplinar é particularmente desafiante, especialmente se for de nível III. A experiência acumulada dos centros com consultas solidificadas por anos de atividade revela que existem dois denominadores comuns para o seu bom funcionamento: liderança e motivação.

De facto, a centralização da liderança que depois coordena com as restantes valências e a existência de um responsável claramente identificado para cada uma delas parece ter
sido a chave para a aparição e consolidação das consultas multidisciplinares de nível III. Por outro lado, só elementos motivados para o tratamento destes doentes poderão resistir à carga assistencial acrescida e aos desafios clínicos e logísticos constantes inerentes e ainda ter capacidade para se atualizar e inovar nos cuidados prestados.

Em suma, a crescente prevalência da diabetes mellitus numa população cada vez mais envelhecida tem aumentado substancialmente a pressão sobre os cuidados de saúde, com particular relevância para uma das complicações mais relevantes que é o pé diabético. A evidência científica e a experiência clínica têm confirmado que a implantação de consultas multidisciplinares dedicadas a essa entidade permite reduzir de forma drástica a taxa de amputação major.

Contudo, a sua implantação e bom funcionamento são deveras desafiantes, implicando uma liderança eficaz e uma motivação constantemente renovada dos seus membros.

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