IPO do Porto: «Estamos a investir muito nas terapêuticas personalizadas»
Há quase três décadas ligado ao Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto, Laranja Pontes assumiu a presidência do Conselho de Administração há praticamente 12 anos, tendo sido vários os investimentos feitos desde então, sempre com foco no doente oncológico, que é verdadeiramente o centro em torno do qual se constrói toda a atividade assistencial do Instituto.
"São os médicos que rodam e não o doente"
Em entrevista de fundo à Just News, publicada no Hospital Público de dezembro, o responsável explica os objetivos que delineou quando assumiu a presidência do Instituto:
"Em primeiro lugar, organizar o hospital por clínicas centradas nos doentes. Em 2007, abrimos a primeira clínica, a da mama. Hoje, todo o hospital está organizado por clínicas."
Qual a perspetiva de criar as clínicas? Para Laranja Pontes, o propósito foi o de "centralizar a organização dos cuidados à volta do doente, ou seja, deslocar a organização do hospital de especialidades médicas para as necessidades dos doentes" e dá um exemplo:
"O doente da mama vai sempre para o mesmo local, a Clínica da Mama. São os médicos que rodam e não o doente. Há médicos que fazem uma ou duas clínicas, mas, antigamente, todos faziam tudo. E isso tinha e continua a ter, na nossa perspetiva, uma grande desvantagem. Hoje, nenhum médico quer fazer tudo. Além dos médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, nutricionistas, todos prestam serviço dentro do contexto da necessidade por clínicas."
"Estamos a investir muito nas terapêuticas personalizadas"
Questionado sobre quais foram os principais investimentos feitos nestes 11 anos, Laranja Pontes começa por destacar a radioterapia:
"Foi, efetivamente, uma das áreas em que fizemos maiores investimentos. Tínhamos um Serviço de Radioterapia antigo, sempre com problemas, e necessidade de recorrer a fornecimento de serviços por prestadores privados. Fizemos um serviço completamente novo, de raiz, centrado nos doentes, até no que respeita ao espaço físico (os doentes estão num corredor central e os profissionais estão à esquerda e à direita)."
Atualmente, acrescenta, "temos um Serviço de Radioterapia absolutamente moderno. Tem área de consulta externa, de imagem e de tratamento, com 9 aceleradores lineares."
Salienta também o investimento no tratamento de doença precoce: "Mudámos o nosso aparelho de tomografia por emissão de positrões (PET) porque achamos que, se é previsível que vamos ter mais cancros em fase inicial, terá de haver uma contraproposta, que é fazer tratamentos o menos agressivos possível."
Assim, e no âmbito desse projeto, "comprámos também um novo acelerador, que entrou em funcionamento em 2016 e que permite fazer tratamentos altamente eficazes em áreas de dimensão muito reduzida. Estamos a investir muito nas terapêuticas personalizadas, pois, achamos que vão ser o top daqui a alguns anos."
Laranja Pontes recorda ainda que o Serviço de Transplantação de Medula Óssea e o Serviço de Terapia Celular são os dois únicos serviços em Portugal certificados pela Joint Accreditation Committee ISCT & EBMT (JACIE), o único sistema de acreditação para unidades de transplante de medula de terapias celulares, para adultos e pediátricos. "Além disso, neste momento, somos o único centro nacional a colher células dendríticas para ensaios clínicos."
Toda esta diferenciação trouxe também, naturalmente, mais doentes: "De 2006 para agora aumentámos cerca de 50%. Tinhamos cerca de 6 mil doentes e hoje temos entre 10-11 mil."
Membros do Conselho de Administração: Ilídio José Nunes de Oliveira Cadilhe (vogal executivo), Rosa Sousa Martins da Rocha Begonha (diretora clínica), José Maria Laranja Pontes (presidente), Maria Isabel Dias Sequeira (enfermeira diretora) e Francisco Nuno Rocha Gonçalves (vogal executivo)
Investigação: "uma peça importante inerente à atividade assistencial"
A investigação tem sido uma das grandes apostas do IPO Porto. "Procuramos estar sempre na vanguarda do diagnóstico", refere Laranja Pontes, acrescentando:
"Somos muito fortes, por exemplo, em áreas como o cancro da mama, o cancro digestivo, ou o cancro da próstata. Estamos a fazer biópsias líquidas, uma metodologia de investigação, mas que já está a ser integrada na assistência. Permite aos doentes com cancro colorretal avançado serem mais facilmente testados e monitorizados, possibilitando a escolha do melhor tratamento de forma mais rápida, menos invasiva e muito sensível."
Explica também que no IPO do Porto, muitas das técnicas básicas de marcadores tumorais (metodologia de avaliação de extensão da doença, DNA circulante, exossomas, por exemplo) são integradas na prática clínica. "Nós somos os únicos em Portugal a fazer determinados painéis de marcadores e estamos a fazê-lo para outros hospitais."
Segundo o responsável, "temos feito tudo aquilo que os nossos médicos e investigadores acham interessante. Por exemplo, na área da mama, fazemos um teste genómico que estuda 50 genes associados ao cancro da mama, determinando, para além do grau de agressividade do tumor, a forma como este se vai comportar, o que tem muito impacto no início da quimioterapia adjuvante."
E sublinha: "Achamos que a investigação é uma peça importante inerente à atividade assistencial."
Ensaios clínicos: doentes com acesso "a fármacos de vanguarda"
Uma das maneiras de incrementar e de dar credibilidade à investigação clínica "foi criar uma unidade de ensaios clínicos, em 2006, com profissionais devidamente qualificados".
Laranja Pontes adianta que "chegamos a ter recrutados 250 doentes novos por ano para ensaios, o que tem um benefício direto de cerca de 1 milhão e meio de euros e indireto de quase 4 milhões de euros". Ou seja, trata-se de mais uma fonte de receita "que se repercute no financiamento de novos ensaios académicos, no aumento da reputação e do rendimento dos profissionais, no incremento de melhores práticas e no acesso dos doentes a fármacos de vanguarda".
Entre vários outros temas abordados, o administrador do IPO Porto adianta, no final da entrevista, que "temos um projeto de eficiência energética em curso, no âmbito do qual já estão aprovados 4 milhões de euros que serão utilizados na modernização do exterior do Instituto, nomeadamente na fachada, que será construída em vidro, com painéis fotovoltaicos".
Quanto ao maior desafio para os próximos tempos, "é acompanhar a revolução digital e começar a mudar o funcionamento do hospital em função das novas exigências e dos novos doentes, que irão querer ter uma relação diferente com os prestadores de cuidados de saúde. Outros cidadãos, outra altura, outros desafios."
"Duas carreiras diferentes"
Laranja Pontes nasceu, em Vila do Conde, no dia 29 de novembro de 1951. Licenciou-se em Medicina pela Universidade do Porto, em 1976. Fez o Internato Complementar na Especialidade de Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética no Hospital Geral de Santo António, que concluiu no final de 1986.
Em maio de 1989 fez o provimento como assistente hospitalar de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva no IPO do Porto, tendo-se tornado diretor do Serviço de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva do mesmo hospital no final do mesmo ano. Em janeiro de 2006 tornou-se presidente do Conselho de Administração do IPO do Porto, cargo que ocupa até hoje.
Afirma ter tido "duas carreiras diferentes": a de médico, até 2005, e a de administrador hospitalar, nos últimos 11 anos. Com 66 anos acabados de fazer, Laranja Pontes aguarda, há um ano, a sua renomeação no cargo de presidente do CA.
A entrevista completa com Laranja Pontes pode ser lida na edição de dezembro do Hospital Público.