«É de capital importância analisarmos o ´saco de medicamentos` do idoso»
A polimedicação é genericamente definida pela utilização habitual de pelo menos cinco fármacos, "sendo que se incluem não só os prescritos pelo médico mas também os não sujeitos a receita médica, para além de outros produtos naturais ou de ervanárias", salienta Ana Valadas, especialista em Medicina Interna com competência em Geriatria.
A médica chama a atenção para este facto já que, "não é infrequente depararmo-nos com o doente que chega com um ´saco de medicamentos` e que, por vezes, não é analisado por já existir um registo eletrónico da medicação habitual, ou por ser possível consultar as prescrições recentes no sistema eletrónico".
Considera, por isso, ser de "capital importância que no contacto que temos com o doente façamos uma revisão periódica de toda a medicação habitual que este cumpre", até porque "muitas vezes, os produtos naturais presentes nesse ´saco de medicamentos` não são explorados".
"A cascata de prescrição é algo a evitar"
Estes doentes têm também uma particularidade bem conhecida... a sua idade: "Pelas comorbilidades e alterações típicas do envelhecimento, os idosos apresentam um alto risco para sofrerem com os efeitos adversos dos fármacos. Note-se que estes originam situações de hospitalização numa proporção quatro vezes maior em idosos, comparativamente com adultos jovens."
E, na sua opinião, o facto de, "nos variados níveis de atuação, a Medicina Interna deparar-se diariamente com o envelhecimento da população" torna esta especialidade particularmente relevante, particularmente evitar que ocorra uma "cascata de prescrição", um fenómeno que ocorre quando "um efeito adverso é tratado como uma nova doença, envolvendo mais um fármaco que é, muitas vezes, desnecessário".
O desafio de analisar as interações e ajustar medicamentos
De acordo com a médica, "na análise do chamado ´saco de medicamentos` importa detetar fármacos que possam estar repetidos – nomeadamente quando numa embalagem surge o nome comercial e noutra o genérico – e, portanto, a ser administrados em duplicado".
E acrescenta: "Analisar todas as interações que possam estar associadas assim como ajustar a dose de determinados medicamentos nos idosos com redução da função renal documentada pode ser igualmente um desafio."
Ana Valadas salienta que se deve "descontinuar ou ajustar fármacos desnecessários, como, por exemplo, os antipsicóticos atípicos após internamento com delirium, ou a terapêutica opioide após cirurgia ortopédica".
Por fim, alerta para a necessidade de serem consideradas "estratégias não farmacológicas para controlo de certos sintomas, assim como usar a dose mais baixa possível e eficaz de um fármaco para determinada condição de saúde", considerando que "a inclusão (ou não suspensão) de todas as medicações indicadas e benéficas para cada doente em cada fase da sua vida é crucial".
Genéricos e apoio social
Ana Valadas alerta ainda para outro aspeto: "Deve ser igualmente tido em conta o custo da terapêutica farmacológica para o doente, tendo em conta a crise atual associada ao custo de vida e as reformas que se praticam hoje em dia no nosso país, podendo fazer a diferença a prescrição de genéricos e a articulação com a assistência social."
Para a internista, este conjunto de fatores a serem abordados na (des)prescrição da medicação no adulto idoso "tornam a tarefa do internista primordial, tendo sempre em consideração o impacto no seu bem-estar, nunca esquecendo o que realmente importa".