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Opinião

Transformação na Saúde: o papel dos Centros de Responsabilidade Integrados


Xavier Barreto

Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares



Na viragem do século, Michael Porter desenvolveu o conceito de Unidade de Prática Integrada (UPI), como proposta de organização de cuidados com potencial para melhorar a prestação de cuidados de saúde.

As UPI procuram essencialmente integrar diferentes áreas clínicas e profissionais numa única entidade organizacional, com o objetivo de oferecer cuidados mais coordenados, acessíveis e centrados no paciente. A agregação de recursos em volta do doente, dentro de uma estrutura única, melhoraria a comunicação entre os profissionais de saúde, contribuindo quer para evitar redundâncias como para melhorar a tomada de decisões clínicas.

Segundo este modelo, as UPI podem oferecer vantagens em 4 dimensões essenciais:

1) Melhoram a coordenação de cuidados, designadamente porque agregam na mesma unidade funcional todos os recursos necessários ao acompanhamento de cada condição/tipo de doente;

2) Melhoram a qualidade dos cuidados, através da padronização de práticas clínicas/adoção de protocolos clínicos baseados na evidência e na definição de percursos assistenciais claros e partilhados por toda a equipa;

3) Favorecem o acesso e a conveniência dos cuidados, porquanto reúnem no mesmo espaço e, em muitos casos, no mesmo momento todos os cuidados de que o doente necessita;

4) Incrementam a eficiência operacional, tanto através da eliminação de atos redundantes e/ou duplicados como através da redução de custos administrativos/de organização da atividade.



Xavier Barreto

A implementação bem-sucedida de Unidades de Prática Integrada tem, por isso, potencial para melhorar resultados clínicos, reduzir custos e melhorar quer a experiência do doente como a satisfação dos profissionais de saúde.

O conceito de UPI não é novo no Serviço Nacional de Saúde (SNS) e tem sido materializado de diferentes formas, ao longo dos diferentes períodos de existência do nosso SNS. A criação de Centros de Responsabilidade Integrados (CRI), de Centros de Referência ou de Unidades de Saúde Familiar são várias faces de aplicação deste conceito de UPI.

Nos últimos anos, tem-se assistido a um ressurgir dos CRI em Portugal. Inicialmente, associados à necessidade de resolver problemas de acesso e com o objetivo concreto de aumentar a produção em áreas com maiores listas de espera. Tendo em conta o propósito com que foram criados (aumentar a produção), é natural que os seus sistemas internos de incentivos tenham sido desenhados em função disso. Promove-se, por isso, o aumento de produção através do pagamento de incentivos individuais, em função da produção adicional realizada.

Sem prejuízo da importância da dimensão acesso, espera-se que os novos CRI possam ser muito mais do que isso. Deseja-se que sejam efetivas Unidades de Prática Integrada, juntando à volta de uma condição ou doente todos os recursos necessários ao seu diagnóstico e acompanhamento. Se os atuais serviços forem transformados em “CRI”, sem qualquer ganho de integração de cuidados, ficarão sempre muito aquém do potencial das verdadeiras UPI.

Para que esta reforma cumpra o seu verdadeiro potencial transformador, é essencial que as unidades se foquem na definição de percursos assistenciais consensualizados no seio da equipa multidisciplinar, integrando sempre a perspetiva do doente.

É crucial que esses percursos sejam estruturados em função dos resultados em saúde que realmente interessam aos doentes, assumindo-os como eixo estruturante da organização de todos os nossos processos de trabalho. No final de cada ciclo assistencial, é imprescindível que os resultados sejam avaliados pelos nossos doentes e que essa avaliação seja parte fundamental da medição do nosso desempenho.

Os sistemas de incentivos devem acompanhar esta visão e estar ao serviço dos objetivos destas unidades. Se incentivamos apenas produção, não podemos esperar melhorias de qualidade ou de eficiência. Mais: se incentivarmos apenas produção, isso representará um enorme problema de equidade para os serviços onde a produção é subfinanciada (designadamente nas áreas médicas/não cirúrgicas) ou para aquelas onde se pretende reduzir a produção (como nos serviços de Urgência).

Pretende-se antes que os sistemas de incentivos se foquem em medidas de desempenho que reflitam a qualidade do trabalho, os resultados clínicos que são atingidos, colocando sempre o doente como avaliador privilegiado dos cuidados recebidos.

Os administradores hospitalares devem ter um papel fundamental nestes novos CRI. A sua criação e estruturação à luz destes princípios obriga à criação de novos percursos, ao envolvimento de novos profissionais e equipas e à definição de novos quadros de indicadores para avaliação de desempenho.

Implica, acima de tudo, uma visão global e integrada de todos os recursos da saúde, uma verdadeira transformação dos modelos de prestação de cuidados, para a qual os administradores hospitalares darão certamente um contributo fundamental.



O artigo pode ser lido na última edição do jornal Hospital Público.

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