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USF Rio de Mouro: A história dos médicos internos que sonharam com uma USF

Mário Machado Cruz é o coordenador da mais recente USF do ACES Sintra, o segundo Agrupamento do País com mais gente sem médico de família. É também um dos médicos que, ainda no Internato, começaram a trabalhar na criação desta USF, situada no antigo Centro de Saúde de Rio de Mouro, nas mesmas instalações que a USF AlphaMouro e a Unidade de Recursos Assistenciais Partilhados (URAP) do ACES Sintra.

“Tudo começou em 2015, com 5 médicos internos – incluindo eu –, que acharam que seria tempo de prestar cuidados de melhor qualidade a esta população”, conta o agora especialista em Medicina Geral e Familiar.

E especifica: “Neste espaço tínhamos a UCSP Rio de Mouro e notava-se que existia uma enorme assimetria de cuidados entre a UCSP e a USF AlphaMouro, que se situa no piso de cima e onde alguns de nós, como eu próprio, fizemos formação.”



Mário Machado Cruz e os colegas cedo se aperceberam de que a única forma de melhorar a acessibilidade da população aos cuidados de saúde primários, nomeadamente atribuindo médico de família a cerca de 20 mil utentes, seria com a criação de uma USF. “Ao todo, foram 2 anos e meio de trabalho para formarmos uma equipa; as pessoas foram entrevistadas e analisámos o seu currículo”, refere.

Um processo diferente do que é habitual, como sublinha: “Geralmente, escolhem-se profissionais que já integram uma UCSP, mas optámos por outra via, mais trabalhosa, mas também mais inovadora.”

O resultado final, para já, é o pretendido: “Ainda aguardamos alguns elementos, mas vamos ter uma equipa com 11 médicos, 10 enfermeiros e 7 secretários clínicos.”

"Manter o equilíbrio entre diferentes costumes"

Tal como a maioria da equipa integrou a equipa da UCSP Rio de Mouro, em 2016, tendo vindo da UCSP Olival Cacém e do Hospital D. Estefânia. Ana Paula Vitorino, 49 anos, nunca tinha trabalhado em modelo USF, mas aceitou o desafio por acreditar que este é o futuro dos CSP.



“O nosso objetivo como enfermeiros é ver a pessoa como um todo, no seu ciclo de vida e englobado na família e na comunidade. Na USF isso é possível”, diz.

Um dos desafios deste novo projeto será a multiculturalidade da população da área de abrangência. “Integro o ACES Sintra há 5 anos e estou habituada a trabalhar com culturas muito diferentes. É muito interessante manter o equilíbrio entre diferentes costumes e a promoção da saúde.”

E dá um exemplo: “Uma colega desta USF participou, quando estava na UCSP Massamá, num projeto de gastronomia, que consistia em ir junto da comunidade africana para ensinar a cozinhar com menos sal e picante, mas mantendo os costumes dos seus países de origem.”

Para Ana Paula Vitorino, este é um bom exemplo de como se podem estabelecer pontes, de modo a que as pessoas possam ter hábitos que previnam ou contribuam para um maior controlo de doenças não transmissíveis, como a diabetes e a hipertensão.

Tal como o coordenador, a enfermeira também já pensa em projetos futuros que vão diferenciar a equipa e que, face às características da população, deverão incidir no Planeamento Familiar e na Saúde Infantil – como ensinar aos pais primeiros socorros e cuidados aos recém-nascidos, mas não só:

“Já estamos, inclusive, a dar alguns passos, como no caso da diabetes. Temos já uma parceria com a Junta de Freguesia de Rio de Mouro para a realização de sessões de educação para a saúde.” A formação e a investigação são outras áreas em que se vai apostar. “Será importante para todos”, diz a enfermeira.




“Uma senhora chorou de alegria ao saber que tinha médico de família...” 

Aos 47 anos, Isabel Veloso está pela primeira vez numa USF. “Vim da UCSP Olival Cacém e trabalhei durante 22 anos no modelo anterior de centro de saúde”, diz.

A vinda para a USF deveu-se, em grande medida, à equipa. “Gosto muito de trabalhar com todas estas pessoas, além disso o modelo USF dá outra estabilidade em termos profissionais para quem trabalha na área administrativa”, realça.



Apesar de ainda estar nos primeiros dias da nova USF, Isabel Veloso diz-se satisfeita com a forma de trabalhar, destacando a intersubstituição e a maior organização no atendimento, por não haver inscrições.

Apesar de os utentes ainda não se terem apercebido das mudanças organizacionais, não tem havido problemas muito significativos no atendimento. Talvez porque há quem tenha tido, finalmente, um médico de família, ao fim de alguns anos. “Uma senhora chorou de alegria ao saber que tinha médico de família, foi impressionante...”, comenta.

Em termos de futuro, espera as obras que permitam ter um balcão de atendimento com melhores condições e a passagem da USF a modelo B.

A multiculturalidade e os projetos futuros da USF

Um ponto que se destaca nesta USF é a diversidade cultural da população. “É um desafio, mas é muito interessante e enriquecedor esta adaptação a culturas e costumes diferentes”, afirma o coordenador da USF Rio de Mouro. Trata-se também de uma área geográfica onde há mais jovens que idosos, contrariamente à realidade habitual do resto do País.

“O nosso foco vai estar bastante na Saúde Materna e Infantil e no Planeamento Familiar”, aponta.



Uma das principais dificuldades que já se sentem tem que ver com a comunicação, por nem todos falarem bem o Português. Mas, como sublinha, “tudo se resolve, seja através da ajuda de amigos e familiares, ou falando em Inglês”. Afinal, “o mais importante é estabelecer pontes, de modo que se vá ao encontro das necessidades dos utentes”.

Uma realidade que também cria oportunidades, segundo Mário Machado Cruz: “Estamos numa fase inicial, ainda necessitamos de nos organizar, mas, no futuro, queremos apostar em projetos, como na área da saúde do viajante, já que temos muitos imigrantes e pessoas que tanto estão em Portugal como noutros países.”

Outras ideias “andam no ar” desde a constituição da equipa, tendo em conta as necessidades da população, a formação e o interesse dos profissionais desta USF.

O nosso interlocutor dá alguns exemplos: “Temos duas médicas que integram a recente Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos. Há quem tenha experiência em cessação tabágica, eu próprio pretendo ter uma consulta de infiltrações periarticulares...”

E, como qualquer USF, caminha-se no sentido de ascender a modelo B e, mais tarde, apresentar a candidatura à acreditação.

“Gosto muito da relação médico-utente”

Aos 31 anos, o especialista em MGF reconhece que tem o privilégio de ter concluído a especialização numa altura em que a reforma dos CSP já se vai consolidando, permitindo, inclusive, a criação de uma USF por parte de médicos recém-especialistas. Algo que é possível pela formação a que se tem acesso em Portugal, segundo Mário Machado Cruz. “Somos muito bem preparados, temos uma formação de excelência”, afirma.



A MGF foi a especialidade que mais o cativou no 6.º ano do curso, após ter feito um estágio na UCSP de Beja, onde teve contacto com a Medicina no meio rural. “Percebi o papel importante e decisivo que o médico de família pode ter junto da população. Além disso, gosto muito da relação médico-utente e de como podemos fazer a diferença na vida de tantas pessoas.”

“É impossível criar uma USF trabalhando apenas 40 horas semanais. A família é a mais prejudicada, sem dúvida.” Uma situação que não lhe agrada de todo. “Dever-se-ia acarinhar mais os profissionais que têm estes projetos que vão melhorar o acesso à saúde e proporcionar-lhes horas para se dedicarem aos mesmos.”

E continua: “Não podemos desgastar os profissionais, é preciso prevenir o burnout, por isso, num futuro próximo, a USF Rio de Mouro vai criar um Núcleo da Felicidade, a pensar no bem-estar da equipa e, como tal, dos utentes.”




A reportagem completa pode ser lida no Jornal Médico de fevereiro.

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