«São os médicos de família que tratam a grande maioria dos doentes hipertensos»

Ao tomar posse, em março de 2023, como presidente da Sociedade Portuguesa de Hipertensão, Rosa de Pinho tornou-se, simultaneamente, a primeira mulher e a primeira médica de família na história da instituição a assumir esse cargo.

Até então, essa responsabilidade foi sendo sempre atribuída a um cardiologista ou a um internista, que representam, aliás, as especialidades hospitalares a que a Medicina Geral e Familiar normalmente referencia os casos suspeitos de hipertensão secundária ou aqueles que, embora sob medicação, não atingem os valores-alvo pretendidos.

“Penso que o facto de os meus colegas de MGF se verem desta forma representados na Direção da SPH foi importante para que se sentissem mais envolvidos naquela que é a missão desta Sociedade. Até porque, afinal, são os médicos de família que tratam a grande maioria dos nossos hipertensos”, sublinha Rosa de Pinho, para logo acrescentar:

“O protagonismo crescente da MGF na atividade da SPH representa uma grande mais-valia, inclusive, quando, por exemplo, programamos as ações de formação dirigidas a esta
especialidade. Os colegas hospitalares são excelentes a fazer as suas apresentações, mas, de facto, torna-se necessário adaptar a comunicação à realidade dos cuidados de saúde
primários. Por exemplo, as limitações que nos são impostas relativamente aos pedidos de exames que precisamos de mandar fazer condiciona muito a nossa atividade diária. Não devia ser assim, mas é isso que acontece.”

No entender de Rosa de Pinho, que coordena a USF Vale do Vouga, em São João da Madeira, o acompanhamento de um doente hipertenso “deve implicar um trabalho de equipa, não só envolvendo médicos de várias áreas, mas também outros grupos profissionais, como os enfermeiros ou os farmacêuticos”.




Consultas cronometradas e muito curtas!


Na sua função de médica de família, a nossa entrevistada tem, desde logo, duas certezas. Primeira: “As consultas são cronometradas e muito curtas!” Segunda: “O doente hipertenso nunca é só hipertenso!”

Resultado: “Não posso considerar que à minha frente está apenas uma pessoa hipertensa. Tenho que ter uma atitude diferente, pois, com certeza que apresentará vários fatores de risco, trabalha, etc. Eu penso que o mais difícil para o doente acaba por ser o ter que lidar com todas as mudanças a fazer na sua vida. Se de repente lhe digo que tem de alterar a dieta alimentar e deixar de beber, que não pode fumar, que tem a medicação para tomar e que ainda deve praticar alguma atividade física de forma regular... pode tornar-se complicado!”

A experiência de Rosa de Pinho diz-lhe ser preferível “ir dando um passo de cada vez” na estratégia de se obter uma alteração, que acaba por ser significativa, no estilo de vida do doente, “que tem que estar motivado para isso”.

O apoio da enfermagem na gestão deste processo “torna-se muito importante”, garante, adiantando que “seria excelente poder contar também com a colaboração, por exemplo, de um nutricionista, o que já não é tão fácil, pois, o tempo de espera para o acesso ao mesmo é, em princípio, grande”.

“Ah, eu esperei muito tempo ali fora na sala!” 

“Conseguir ter o doente hipertenso controlado é uma grande dificuldade para qualquer médico, desde logo porque acontece frequentemente ele não perceber a importância de fazer com rigor a medicação que lhe foi prescrita”, frisa.

“Mas nós também temos uma quota-parte de responsabilidade em relação a não atuar precocemente quando se suspeita de que a terapêutica prescrita possa não ser a mais adequada, ou porque simplesmente é mesmo necessário iniciar um tratamento. Isso acontece, por exemplo, quando, pressionados pelo tempo de consulta e dando o ‘benefício da dúvida’ ao utente, aceitamos o motivo que este apresenta para justificar, por exemplo, uma tensão sistólica acima do valor aceitável”, admite Rosa de Pinho.

“Ah, eu esperei muito tempo ali fora na sala!” ou “Tive uma chatice no trabalho!” são razões apresentadas que levam frequentemente o médico de família a condescender e a marcar a próxima consulta para daí a seis meses... “Ora, estamos a falar de um intervalo de tempo muito grande quando,  eventualmente, se pode estar perante um caso que precisaria que fosse dispensada naquele momento mais atenção”, conclui a nossa interlocutora.


“Esta medicação é para o resto da vida!” é uma expressão que, sublinha a presidente da SPH, “já não é usada hoje em dia, desde logo no tratamento do doente com hipertensão, pois, em qualquer altura pode ser necessário definir a terapêutica mais adequada para cada situação”.

Rosa de Pinho deixa o aviso: “De nada serve termos a pessoa medicada se a sua pressão arterial não estiver controlada!”




Congresso anual da SPH com participação multidisciplinar


O Congresso Português de Hipertensão e Risco Cardiovascular Global, cuja edição 19 decorrerá entre 13 e 16 de fevereiro, em Albufeira, reúne participantes de várias especialidades médicas e de outros grupos profissionais. Acaba por ser, afinal, o reflexo do painel de sócios que formam a SPH.

Cerca de 40% dos membros desta Sociedade são internos e especialistas de Medicina Geral e Familiar, com a Medicina Interna a classificar-se em 2.º lugar, logo seguida da Cardiologia. A eles se juntam alguns representantes da Endocrinologia, da Nefrologia e da Pediatria. Mas a SPH também admite sócios não médicos, onde se incluem enfermeiros e farmacêuticos, mas também, por exemplo, cardiopneumologistas e nutricionistas.


Presidido por Rosa de Pinho, por inerência do cargo que exerce na SPH, o Congresso tem como presidente da sua Comissão Organizadora o internista Fernando Martos Gonçalves. Este médico do Serviço de Medicina Interna do Hospital Beatriz Ângelo (ULS de Loures-Odivelas) assumirá, em março, a presidência da Sociedade Portuguesa de Hipertensão.

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