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Oncologia do HESE envolve equipa de cuidados paliativos na Consulta de Decisão Terapêutica

Ter uma noção do contexto sociofamiliar dos doentes oncológicos que necessitam de cuidados paliativos é algo fundamental para o diretor do Serviço de Oncologia Médica do Hospital do Espírito Santo de Évora (HESE). Compreende-se, assim, que Rui Dinis tenha querido envolver os próprios cuidados de saúde primários numa Consulta de Decisão Terapêutica que é verdadeiramente multidisciplinar.



"Perceber melhor o que se passava em casa de cada doente"

São 10 horas da manhã de uma segunda-feira de abril quando Rui Dinis, diretor do Serviço de Oncologia Médica do Hospital do Espírito Santo de Évora (HESE), se reúne com a Equipa Comunitária de Suporte de Cuidados Paliativos (ECSCP) Ametista, do ACES Alentejo Central.

O também diretor do Programa Regional de Oncologia do Alentejo coordena, desde 2015, a Consulta de Decisão Terapêutica, na qual já participavam diferentes especialidades hospitalares, nomeadamente, a Cirurgia Geral, a Radioterapia, a Urologia, a Otorrinolaringologia, a Anatomia Patológica, a Imagiologia e a Farmácia Hospitalar.

Mas faltava algo: “Sentia necessidade de perceber melhor o que se passava em casa de cada doente, de saber qual era realmente o seu contexto sociofamiliar, para que se prestassem os cuidados mais adequados.”

Na reunião "todos têm voz" 

Essa lacuna acabou por ser preenchida na sequência da criação, no dia 3 de março de 2018, da ECSCP Ametista, que integra o ACES Alentejo Central, com polos em Évora e Estremoz. Ao fim de poucos meses, mais precisamente em dezembro desse ano, Rui Dinis contactou a médica Liliana Sousa e a enfermeira Cristina Madeira, procurando promover uma maior articulação daquela equipa com o seu Serviço.


Elementos da ECSCP Ametista, antes de mais uma visita domiciliária

“Há cada vez mais pessoas que querem morrer em casa e isso só pode acontecer com a prestação de cuidados paliativos, que devem ser preconizados logo em fases iniciais, não apenas nas últimas semanas de vida”, afirma o médico, em conversa com a Just News. Na reunião "todos têm voz" e a opção por uma dada terapêutica tem em conta a evolução da doença mas também o que poderá estar por detrás de uma agudização da condição clínica.

“Deslocando-se ao domicílio, quer a médica como a enfermeira conseguem aperceber-se, com alguma facilidade, se o cuidador está a administrar de forma adequada determinada medicação. Aqui no hospital não conseguimos nunca saber tudo, até por alguma falta de tempo disponível para tal, mas também por haver informações que apenas se conseguem obter em casa do próprio doente”, explica Rui Dinis.



Uma das grandes vantagens que o diretor do Serviço de Oncologia Médica do HESE vê nesta ligação aos CSP consiste numa maior aproximação às famílias, que se sentem mais confiantes por se aperceberem que o Hospital e os CSP estão unidos em prol da pessoa que está doente. Até porque “a uniformização da linguagem é deveras importante, para se evitar qualquer tipo de confusão e até de desconfiança”.


Rui Dinis

"A pessoa não é apenas a doença oncológica"

A Just News falou igualmente com Maria Meneses, médica interna de 3.º ano de Oncologia, que veio dos Açores para o Continente para fazer a especialidade, vê nesta articulação com os CSP “enormes mais-valias”, nomeadamente no momento de se tomar decisões:

“Temos uma noção do doente como um todo, porque a pessoa não é apenas a doença oncológica. Onde vive, com quem vive, os conhecimentos que existem para administrar a medicação  em casa... Tudo isto é relevante!”


Maria Meneses

Outro ponto que gosta de realçar prende-se com o respeito pela vontade de cada doente, já que muitos querem morrer em casa. “Infelizmente, em Portugal, as estatísticas indicam que a maioria acaba por falecer no hospital. Com a prestação de cuidados paliativos no domicílio é possível, a quem assim o entenda, permanecer num ambiente mais acolhedor e próximo de quem mais ama.”

No futuro, como especialista, Maria Meneses acredita que esta experiência vai fazer com que fique “mais desperta” para a necessidade de ver o doente na sua globalidade, tendo em atenção, inclusive, a realidade da sua habitação.

“O Dr. Rui Dinis é um impulsionador da prestação de cuidados paliativos na região alentejana”

O convite feito pelo diretor do Serviço de Oncologia do HESE para que a ECSCP Ametista integrasse a Consulta de Decisão Terapêutica não podia ter sido melhor recebido. Cristina Madeira diz mesmo que “o Dr. Rui Dinis foi, sem dúvida, quem acreditou no nosso projeto, sendo um impulsionador da prestação de cuidados paliativos na região alentejana”.

A enfermeira considera que este “elo de partilha e trabalho” é muito importante, quer para os doentes como para os seus familiares, por se discutirem os casos de forma multidisciplinar.

“Permite-nos dar apoio de uma forma mais harmoniosa. Numa fase inicial, as famílias receavam que alterássemos as indicações do médico hospitalar, contudo, quando se explicava que havia uma articulação entre nós, acabavam por se sentir mais seguras e tranquilas.”


Liliana Sousa e Cristina Madeira

A participação dos elementos da ECSCP Ametista na Consulta tem sido também uma maneira de sensibilizar para a necessidade de se investir mais em cuidados paliativos numa mais fase mais precoce, de forma a estabelecer “uma relação terapêutica mais eficaz”.

“Desde 2018 que se nota, de facto, que somos chamados a intervir cada vez mais cedo, mesmo em situações que envolvem outras especialidades, e já não existe tanto a ideia de que o nosso papel é estarmos junto do doente apenas nas últimas semanas e horas de vida, quando se considera já não haver nada a fazer”, acrescenta a médica e coordenadora da ECSCP Ametista, Liliana Sousa.

Deslocando-se a casa dos doentes, a sua missão não se limita apenas à prática de atos médicos e de enfermagem e a transmitir aos profissionais do Serviço de Oncologia o que vai correndo melhor ou pior. Escutar o que vai na alma do doente ou dos seus familiares é um dos principais objetivos, pelo benefício que tem, igualmente, no controlo dos sintomas físicos.

“Não é fácil gerir este tipo de situações. O caminho é, muitas vezes, sinuoso, sendo normal sentir-se alguma revolta. Estamos atentos a este tipo de sentimentos, quer por parte de quem precisa de cuidados diretos como da própria família”, sublinha Cristina Madeira.

Intervenção do Serviço Social: "ainda não é a situação ideal"

A enfermeira faz questão de esclarecer que a ECSCP Ametista integra "uma assistente social, como seria expectável, mas infelizmente não a tempo inteiro. Contudo, sempre que necessário faz visitas conosco. Claramente que não é a situação ideal, mas é neste momento o possível".



“Fazer o luto antecipatório é essencial”

O apoio prestado pela Equipa do ACES Alentejo Central permite apostar no chamado luto antecipatório, para que o processo, já de si doloroso, seja “o mais sereno e tranquilo possível”.

Para além de duas médicas e outras tantas enfermeiras alocadas  a cada um dos polos (Évora e Estremoz), a ECSCP Ametista possui uma psicóloga também a tempo inteiro, que ajuda no processo de luto antecipatório e após o falecimento.


Helena Chouriço

Contratada em agosto de 2020, no âmbito do reforço das equipas por causa da pandemia de covid-19, Helena Chouriço tem como função minimizar uma dor que, em todo o caso, será sempre muito forte. “Verifica-se que tanto os doentes como os seus cuidadores estão fragilizados, com alguns deles a mostrarem sinais de negação da realidade”, refere a psicóloga.

Helena Chouriço considera que o ser humano tem competências inatas para cuidar (e bem) de quem precisa, contudo, estas são situações muito dolorosas, que requerem, com frequência, apoio psicológico:

“Fazer o luto antecipatório é essencial, quer do ponto de vista emocional como nas questões mais organizacionais: partilha de bens, orientações, etc. Tudo isto exige uma certa preparação, para que depois da morte se consiga lidar com a perda de uma forma mais fácil, evitando, inclusive, graves depressões.”

“A forma como se aceita o fim depende de cada um, da sua personalidade, da experiência de vida e até de eventuais crenças. Por exemplo, nota-se que as pessoas que têm determinada fé acabam por ter outro suporte”, afirma.



Na opinião de Helena Chouriço, é crucial fazer-se tudo para que o doente tenha uma morte “digna e tranquila”, bastando apenas, nalguns casos, saber o que mais o acalma. Recorda dois casos: o do senhor que faleceu a ouvir música clássica ou o da mãe que quis deixar um vídeo de despedida ao filho. Informações que, recorde-se, vão sendo partilhadas entre os CSP e o hospital, num diálogo constante, para o bem destes doentes.

Estando a dar apoio a 300 doentes por ano, em média, a ECSCP quer manter este contacto permanente com o hospital, pelo benefício direto para doentes e familiares e também para a própria equipa de Oncologia, que fica com uma noção mais exata da realidade que está para lá das portas do hospital.



A reportagem pode ser lida na edição de novembro/dezembro do Hospital Público.
Dirigida a profissionais de saúde e distribuída em serviços e departamentos de todos os hospitais do SNS, esta publicação da Just News tem como missão a partilha de boas práticas, de boas ideias e de projetos de excelência desenvolvidos no âmbito do SNS, facilitando a sua replicação.

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