Hospitalização Domiciliária do CHBV amplia a prestação de cuidados a lares de idosos
“A Hospitalização Domiciliária concede ganhos em saúde a nível da capacitação dos doentes e da melhoria da sua qualidade de vida, somando-se a diminuição de idas à Urgência”, começa por explanar Nino Coelho, o enfermeiro que muito impulsionou a criação deste projeto e um dos coordenadores, desde o seu início, em maio de 2019.
Nino Coelho
Especializado em Enfermagem Comunitária, na vertente de Envelhecimento, esta sempre foi uma área que lhe interessou e que procurou difundir junto dos colegas. “Em todas as urgências que fazíamos, este era um tema que o enfermeiro trazia, dada a sua formação académica e a crença que tinha neste modelo de cuidados”, recorda Susana Cavadas, internista e coordenadora médica desta Unidade.
À data, existia menos de uma dezena de unidades a funcionar no país. O Hospital Garcia de Orta, primeiro, e o CH de Vila Nova de Gaia/Espinho, que havia arrancado com este projeto um ano antes, foram as duas instituições que serviram de modelo a seguir.
Susana Cavadas realça a “grande mais-valia de terem aprendido com dois serviços de grande dimensão e que, de maneiras diferentes, partilharam ideias, critérios clínicos, formas de organização e de tratamento de dados, encurtando o caminho que teríamos de percorrer”.
A médica não tem dúvidas de que “o primeiro ano foi uma real curva de aprendizagem para todos” e, se alguns medos ainda subsistem, a verdade é que já procederam a transfusões de sangue no domicílio, por exemplo, e têm vindo a admitir doentes cada vez mais complexos.
“Já percebemos que somos capazes de chegar até aos doentes em tempo útil para os socorrer, com o equipamento e o material clínico necessários, que são em tudo iguais aos que se encontram nos carros de emergência de um serviço de internamento convencional”.
Tanto a classe médica como a de enfermagem estão disponíveis para atuar 24 horas sobre 24, o que “garante o princípio da equidade de acesso à pessoa que está internada no domicílio relativamente ao internamento convencional”, salvaguarda o enfermeiro.
Ampliar a referenciação a partir dos CSP
A internista acredita que a dificuldade de referenciação dos colegas advém ainda do “desconhecimento que têm face a este modelo, que resulta num enorme receio de retirar os doentes do hospital, acabando apenas por os referenciar, muitas vezes, numa situação de pré-alta”.
No entanto, é um comportamento que não julga, por também ela o ter experienciado: “É um processo moroso, que implica alguma mudança de mentalidade e o ultrapassar de medos e inseguranças, até se chegar a um nível de tranquilidade.”
Na ótica de Susana Cavadas, esta mudança de paradigma pode ser mais bem acolhida através de sessões informativas que divulguem o tipo de doentes elegíveis, “porque muitos profissionais ainda concebem que nestas unidades apenas possam ser admitidos doentes com quadros clínicos crónicos e ligeiros”.
Susana Cavadas
A médica esclarece que também os colegas dos CSP devem ser "sensibilizados a referenciar os doentes diretamente para este modelo, como forma de contornar urgências evitáveis".
A título de exemplo, identifica que “uma insuficiência cardíaca descompensada ou uma infeção urinária que exijam a administração de terapêutica endovenosa devem ser situações motivadoras de um contacto direto à Unidade, que se desloca ao centro de saúde ou à casa do doente, fazendo a sua admissão de forma direta.
Inclusivamente, aquando da criação desta Unidade, Susana Cavadas reuniu-se com o ACES Baixo Vouga 2 para expor o projeto e participou ainda numa reunião virtual que juntou orientadores de formação e internos, chegando a profissionais das diferentes estruturas dos CSP, que têm vindo a referenciar vários doentes.
Lares de idosos: maior conforto e menor risco de infeção
Esta dinâmica pretende ir ainda "mais além" e está a ser ampliada às estruturas residenciais para idosos (ERPI), a fim de "internar os doentes diretamente nos lares, garantindo um maior conforto a estas pessoas de mais idade".
A internista adianta que os vários lares aos quais propuseram esta solução facilmente percecionaram que “este regime não se traduziria numa sobrecarga de trabalho para os seus profissionais – que apenas teriam de substituir as famílias no papel de cuidadores".
Por outro lado, ficou igualmente claro para todos os intervenientes "que seria uma mais-valia para os doentes, desde logo, por diminuir o risco de infeção hospitalar”.
Assim, aquando da comemoração dos dois anos de atividade da Unidade, foi assinado o primeiro protocolo com o Centro de Ação Social do Concelho de Ílhavo, uma instituição que agrega duas ERPI. A partir de então, foram já assinados vários outros protocolos.
Note-se que esta Unidade ainda é das poucas que já internam doentes de unidades de cuidados continuados de média e de longa duração.
Elementos da equipa da UHD
Definir protocolos de atuação com a área cirúrgica
A título futuro, esta a UHD do CH Baixo Vouga tem projetado no seu plano de atividades uma ampliação de cinco camas e a aquisição de uma terceira viatura. Nino Coelho fala ainda na necessidade de um maior espaço no hospital para o corpo de Enfermagem conseguir “gerir e organizar materiais e equipamentos clínicos, assim como terapêutica oral e endovenosa para as 24 horas”.
À data em que esta reportagem foi realizada, em meados de novembro, esta Unidade havia iniciado um processo de certificação pela Direção-Geral da Saúde, de acordo com o modelo da Agencia de Calidad Sanitaria de Andalucía (ACSA), por ser considerado o que melhor se adapta aos critérios definidos na Estratégia Nacional para a Qualidade em Saúde e por ser ainda um modelo consolidado e reconhecido.
O enfermeiro coordenador reconhece que este processo trará consigo reais melhorias, no entanto, não tem dúvidas de que a própria expansão para 15 camas e a viabilização dos projetos estará pendente, principalmente, do reforço da equipa. Neste quadro de projetos, destaca-se o protocolo com o Serviço de Cirurgia, a iniciar no decorrer de 2022, de forma a alargar a prestação de cuidados a doentes cirúrgicos com toda a segurança.
Tendo já acontecido internar este tipo de casos para terminar ciclos de antibiótico, na sequência de complicações infeciosas no pós-operatório, a verdade é que, “enquanto internistas, há especificidades do âmbito da Cirurgia que não dominamos e a segurança acresce se existir um cirurgião a quem recorrer em caso de dúvida, agravamento ou necessidade de referenciação”.
A equipa de Enfermagem ambiciona ainda projetar a vertente da reabilitação domiciliária, com horas dedicadas e uma prática sistematizada, com a análise de indicadores e ganhos em saúde. No âmbito da prestação de cuidados a doentes cirúrgicos, que “não necessitam de apoio médico diário”, Nino Coelho considera que este campo da enfermagem de reabilitação ganha um peso ainda maior.
Também neste âmbito, foi iniciado, em setembro de 2020, um processo de análise de dados de produção mensal, tratado a nível nacional e monitorizado pelo Ministério da Saúde. “Além de submetermos os dados numa plataforma central, procuramos internamente comparar a nossa produção com unidades que estão ao nível da dimensão do nosso centro hospitalar”, esclarece.
A reportagem completa pode ser lida no jornal Hospital Público 32, que inclui também entrevistas a Rosa Jorge, diretora do Serviço de Medicina Interna, e a Margarida França, presidente do Conselho de Administração do CHBV.