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Cuidar de utentes com feridas complexas nos cuidados primários: CPTFeridas celebra 9 anos

Há 9 anos que a Comissão de Prevenção e Tratamento de Feridas do ACES Póvoa de Varzim/Vila do Conde desenvolve ações que contribuem para obter os melhores resultados e uma maior qualidade na prestação de cuidados aos utentes com feridas complexas. Um dos segredos dos bons resultados obtidos é a existência de dinamizadores em todas as unidades funcionais daquele ACES, mas também a aposta na capacitação de profissionais e cuidadores.



A utente tem 102 anos, sofre de demência e está acamada há 9 anos. A filha deixou de trabalhar, para poder cuidar da mãe, mas admite que, se não fosse o apoio da Comissão de Prevenção e Tratamento de Feridas (CPTFeridas) do ACES Póvoa de Varzim/Vila do Conde e da equipa de Saúde Familiar, a sua familiar poderia não ter chegado aos 100 anos.

Ao todo, foram cinco úlceras por pressão (UPP) que pioraram bastante o seu estado de saúde global. A Just News pôde testemunhar que a utente se sentava na cama e na cadeira, tendo já todas as úlceras cicatrizadas.

Esta é apenas uma das muitas “histórias de vida” que são acompanhadas pela equipa multidisciplinar da CPTFeridas, constituída por 4 enfermeiros, 2 médicos, uma assistente social e uma nutricionista. Até há pouco tempo, a farmacêutica Ana Isabel Ferreira, da ARS Norte, integrava também a Comissão. Na altura em que esta reportagem foi realizada, aguardava-se a sua substituição.


Assunção Magalhães, coordenadora da CPTFeridas

Os membros desta Comissão fazem parte de equipas de unidades funcionais diferentes (USF, UCC e URAP) e da Direção de Enfermagem, e nenhum deles está em exclusivo na Comissão, tendo de conjugar esta responsabilidade com as restantes atividades. Todavia, fazem-no com vontade e dedicação, face aos bons resultados que se observam.


“Há mesmo quem diga que voltou a viver, pois, o odor intenso e o exsudado de algumas feridas mais graves e complexas impedem a pessoa de ter vida social e familiar. Assistimos a uma melhoria significativa na qualidade de vida, inclusive, dos cuidadores e família”, refere Assunção Magalhães, coordenadora da CPTFeridas desde o primeiro dia do projeto.

De facto, a dor, o odor intenso, a vergonha e a solidão muitas vezes são comuns a quem vive com uma ferida. Foi precisamente por este “problema emergente na área da saúde” que, em 2011, Assunção Magalhães, a enfermeira Elisa Meira, vogal do Conselho Clínico e de Saúde, e outros colegas do ACES Póvoa de Varzim / Vila do Conde criaram o projeto “Terapia Compressiva”, ao qual se seguiu um outro, denominado “A Pessoa com Ferida”.



CPTFeridas: “A ideia foi ter uma equipa multidisciplinar estruturada"

Foi com muitas referenciações a acontecerem que arrancou oficialmente, no dia 13 de novembro de 2013, a CPTFeridas. “A ideia foi ter uma equipa multidisciplinar estruturada, com uma forte coesão interpares, para uniformizar e sistematizar diagnósticos e intervenções na prevenção e no tratamento das feridas e para capacitar utentes e cuidadores”, explica Assunção Magalhães.

“Até à data, temos uma elevada taxa de sucesso na cicatrização, e nem mesmo durante o período mais crítico da pandemia deixámos que a situação se agudizasse, porque a consultoria e o acompanhamento foram sempre assegurados presencialmente, por teleconsulta ou por videochamada”, acrescenta a responsável.

A Comissão de Prevenção e Tratamento de Feridas também tem apostado na investigação, tendo realizado, em 2019, um estudo que envolveu a colaboração das equipas das unidades funcionais. “Verificámos que o índice de sobrecarga do cuidador era de 37% e que 83% não tinham qualquer tipo de conhecimento sobre úlceras por pressão”, refere a nossa interlocutora.

Na posse destes dados, investiu-se ainda mais na capacitação dos cuidadores, a fim de se prevenir o burnout. “A sobrecarga é muito grande, têm de cuidar durante todos os dias, 24 sobre 24 horas, não conseguindo, muitas vezes, descansar durante o período da noite”, observa Assunção Magalhães.


Isabel Azevedo: "Quando nos deslocamos a um domicílio, queremos também cuidar, ensinar e esclarecer dúvidas"

Ser “o apoio técnico e humano”


Testemunha dessa sobrecarga é a enfermeira Isabel Azevedo, que integra a equipa desde 2013 e que já acompanhou muitas famílias que vivem situações muito delicadas, agravadas por fatores socioeconómicos:

“Há quem fique desempregado para poder cuidar da mãe, do pai…” A situação só não é pior porque na região ainda é comum os vizinhos ajudarem-se uns aos outros, principalmente no meio rural. Além disso, quando a equipa se desloca a um domicílio, o seu foco não é exclusivamente tratar, mas também "cuidar, ensinar e esclarecer dúvidas".

“Somos, de alguma forma, o apoio técnico e humano. É fundamental que saibam e sintam que podem contar connosco, porque enfrentam um emaranhado de emoções e a nossa presença e disponibilidade, inclusive por telefone, tem sido crucial”, garante Isabel Azevedo.


Isabel Azevedo

Cria-se, deste modo, uma relação de confiança, que foi ainda de maior relevância durante o período de confinamento, devido à pandemia por covid-19. “Nunca parámos! O nosso trabalho é essencial e, com as devidas medidas de segurança e de higienização, foi possível manter sempre esta resposta”, diz a enfermeira.

Dinamizadores constroem pontes e envolvem a comunidade

Além da equipa nuclear, foram designados "enfermeiros  dinamizadores" que, atentos a esta problemática, procuram junto das equipas que integram aferir necessidades e dinamizar atividades e boas práticas.

“A CPTFeridas tem um papel relevante no que se refere a consultoria, nomeadamente, na orientação e suporte à decisão, elaborando e concretizando um plano formativo e a emissão de pareceres”, realça Assunção Magalhães.

É, ainda, responsável por várias iniciativas de capacitação e literacia em saúde do utente e do cuidador e da formação dos profissionais de saúde. "Para este efeito, foram criados planos formativos e manuais de suporte, procedimentos e pagelas de bolso que ajudam médicos e enfermeiros a caracterizar melhor uma ferida, a decidir o tratamento e a prevenir a ocorrência da mesma", explica a responsável.

O Manual do Cuidador, por exemplo, resultou de uma parceria com o ACES e com a Escola Secundária José Régio, de Vila do Conde, envolvendo mais especificamente os alunos do curso de Artes Visuais.


“Quisemos que a comunidade participasse, porque também é uma forma de se promover a educação para a saúde”, justifica a coordenadora da CPTFeridas. Um dos materiais utilizados é uma régua graduada, com informação visual quanto à medição de feridas regulares e irregulares.

“É muito importante haver uma uniformização em todas as práticas, inclusive nos registos”, sublinha Assunção Magalhães. Salienta ainda como atividade fundamental a realização de auditorias, conforme previsto no Plano Nacional de Segurança do Doente.


Judite Neves, diretora executiva do ACES Póvoa de Varzim/Vila do Conde (que aprovou e apoiou a criação da CPTFeridas), com alguns dos elementos da equipa: Assunção Magalhães, Isabel Azevedo, Cátia Borges e Gilberta Carvalho


Elementos da CPTFeridas


Enfermeiros
Assunção Magalhães (Direção de Enf.)
António Soares (UCC Vila do Conde)
Isabel Azevedo (USF Santa Clara)
Paulo Ramos (USF Corino de Andrade)

Médicos
Pedro Ferreira (USF Cruz de Malta)
Pedro Almeida (USF S. Simão da Junqueira)

Nutricionista
Cátia Borges (URAP)

Assistente social
Gilberta Carvalho (URAP)



A reportagem completa, com entrevistas a outros profissionais da CPTFeridas, pode ser lida no Jornal Médico dos cuidados de saúde primários de outubro 2022.

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