Estatinas: «Os sintomas que os doentes referem são genuínos, mas causados por um efeito nocebo»

O cardiologista António Valentim Gonçalves, do Hospital de Santa Marta, foi um dos palestrantes convidados a participar na 5.ª Reunião do Núcleo de Estudos de Prevenção e Risco Vascular da SPMI, tendo assegurado uma das sessões de Hot Topics, precisamente a dedicada à cardiopatia isquémica.

Um dos dois assuntos que selecionou para abordar, por serem novidade na Cardiologia, foi precisamente o conceito clínico de intolerância a estatinas. Apresentou, a esse respeito, um estudo britânico (SAMSON) que randomizou 60 doentes para fazer sequencialmente atorvastatina 20 mg, um placebo semelhante à atorvastatina 20 mg ou não fazer qualquer medicação.

Os autores conseguiram demonstrar que os sintomas reportados pelos doentes ao longo do estudo se deveram a um efeito nocebo e não como resultado estritamente único da toma de estatinas, uma vez que a taxa de sintomas foi semelhante nos grupos com atorvastatina e com placebo, mas claramente superior a não fazer qualquer medicação.

António Valentim Gonçalves

“Assim, os sintomas que os doentes referem muitas vezes quando fazem estatinas são genuínos, mas são causados maioritariamente por um efeito nocebo e não pela estatina em si”, concluiu o cardiologista.

António Valentim Gonçalves também deixou expresso que “a comunicação com os nossos doentes poderá ser um fator chave para aumentarmos a percentagem dos que toleram estes fármacos, com benefício cardiovascular amplamente demonstrado”.



"Precisamos de melhorar bastante o controlo lipídico"


Essa constatação coincide com a opinião de Rodrigo Leão, formada na sua prática clínica, que assenta muito na Consulta de Hipertensão e Dislipidemias, que está integrada no Núcleo de Investigação Arterial do Hospital de Santa Marta (ULS de São José).

“Verifico isso constantemente nos doentes que recebo, embora não naqueles que são referenciados internamente pelos colegas da Cardiologia, ou mesmo da Cirurgia, que já estão muito atentos a esta situação", refere o médico, acrescentando:

" Tenho imensos doentes a fazer estatinas que relatam a existência de sintomas, essencialmente dores musculares, mas que, na verdade, apresentam uma baixa probabilidade de intolerância à medicação, obrigando a um esforço de educação e sensibilização junto dos mesmos para o seu problema de saúde."

Rodrigo Leão

Na sua opinião, não há qualquer dúvida de que, “na dislipidemia, há um trabalho longo a fazer". Relativamente aos doentes, "é necessário convencê-los de que, na maior parte dos casos, a terapêutica com estatinas não faz mal, pelo contrário, protege e evita muitas mortes".

No entanto, sublinha que "há também um esforço de esclarecimento que tem de ser feito junto dos clínicos, porque muitos continuam ainda hoje a prescrever estatinas de baixa potência. E nós precisamos de melhorar bastante o controlo lipídico que temos atualmente!”

 

 

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